Publicada em 27/11/2020
A pandemia aumentou a
pressão por um Refis da Covid-19, com parcelamento de débitos das dívidas de
empresas e pessoas físicas, que cresceu com a volta do pagamento dos impostos
que tinham sido suspensos. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deu
encaminhamento a projeto de lei que cria o Programa Extraordinário de
Regularização Tributária durante a pandemia. Desde maio, o projeto estava
esperando o despacho de Maia para seguir a tramitação nas comissões na Câmara.
O novo Refis foi apresentado pelo deputado Ricardo Guidi (PSD-SC). Já há
requerimentos para votação da urgência (ou seja, furar a fila para apreciação
no plenário).
Guidi defende sua proposta de lei como exemplo de medida fiscal
adotada internacionalmente, em razão da pandemia, em especial por países como
Estados Unidos, China, Japão, Coréia do Sul, Reino Unido, Itália, Alemanha e
França. Com a volta da cobrança dos impostos, os contribuintes precisam pagar
no mesmo mês duas vezes o mesmo imposto: o valor que estava suspenso e o do mês
corrente.
Na área técnica do Ministério da Economia, no
entanto, há uma avaliação de que quanto mais Refis são abertos, um número maior
de contribuintes deixa de pagar regularmente os tributos.
Números apresentados
pelo Tesouro Nacional mostram que o governo tem a expectativa de recuperar
apenas 18% (ou R$ 441 bilhões) do total da dívida ativa acumulada pela União
nos últimos anos - a maior parte de impostos e contribuições ao INSS. Quase R$
2 trilhões da dívida ativa já são considerados como perdidos. É o chamado ralo
tributário, que na prática retira recursos do Orçamento. Os números foram
incluídos em relatório sobre os riscos fiscais do governo divulgado ontem pelo
Tesouro.
Para o Ministério da Economia, o alto valor reforça a
necessidade de avançar na reforma tributária para simplificar a tributação e
diminuir as brigas na Justiça entre o Fisco e os contribuintes.
Ainda de acordo com os dados do Tesouro, o valor do estoque de ações judiciais contra a União aumentou 324% de 2014 até junho de 2020, passando de R$ 560 bilhões para R$ 2,37 trilhões, sendo 66% de perda possível e 34% de perda provável, com elevada concentração de ações de natureza tributária (inclusive previdenciária). A realização de despesas anuais decorrentes de perdas judiciais tem acompanhado este movimento ascendente: enquanto em 2014 esse gasto foi de R$ 19,8 bilhões, para 2020 a estimativa chega a R$ 54 bilhões.
DEFESA
Para o ex-secretário-adjunto da Receita Federal Paulo Ricardo
Cardoso, neste momento de forte crise econômica a possibilidade de negociação
das dívidas tributárias poderia salvar empregos e empresas, e um novo
parcelamento poderia se justificar "diferentemente dos Refis do passado,
que não tinham fundamentos econômicos". "Nunca tivemos crises tão fortes
no passado quanto esta que justificassem aqueles Refis", afirmou.
O ex-secretário defende a adoção de mecanismo para favorecer os
bons contribuintes, que só não se manteriam de forma regular por não terem
atividade econômica e disponibilidade financeira, resultado do forte recuo da
atividade econômica principalmente no 1.º semestre. "Em geral, a dívida
que não é paga, que é rolada a cada Refis, não é dos bons contribuintes, mas
dos devedores contumazes", diz
O tributarista Luiz Bichara, da Bichara Advogados, avalia como difícil a
aprovação este ano do projeto, que tem de tramitar ainda nas comissões de
Constituição e Justiça (CCJ) e Tributação. "Acredito que depende também do
sucesso da transação tributária. Se vingar, diminui a pressão por Refis",
avalia Bichara.
Para ele, a transação está evoluindo bem, com uma postura elogiável da
Fazenda Nacional no sentido de resolver a situação concreta dos contribuintes,
reconhecendo o momento peculiar de crise aguda. A transação é uma espécie de
"Refis caso a caso" e permite descontos nas dívidas em atraso de até
70% para as empresas e 50% para pessoas físicas.
Para Bichara, não basta debater só a reforma tributária, mas sim métodos
melhores de cobrança. "Sabe qual o índice de recuperabilidade dos últimos
anos? 1%", aponta. Na sua avaliação, o governo federal deveria tratar os
créditos que ele próprio considera como irrecuperáveis como as empresas tratam
seus créditos podres. "Por que não vende, então? Faz um leilão. Se
conseguir 10%, dá quase a arrecadação gerada com a repatriação", sugere.
Fonte: Correio do Povo